22 fevereiro, 2012

Quarta-feira de cinzas

Fome
de som
de chêro
de tempêro

reflito ainda bêbado sobre esse "quê" intenso
somente uma força ancestral pode fazer aquilo

Foram vários os dias
de folia, amor e alegria
em momentos todos coloridos

logo hoje que o meu despertador tocou bem atrasado
enquanto eu sonhava mil sóis atravessando a janela

O dia acordou
com a mesma cor
da calça do detento

reflito ainda bêbado se; a fome tem cor ?
desço a colina e começo a prestar atenção

Algumas gaivotas
fedor de cela e mijo
crianças dormem na praça

reflito ainda bêbado se; a fome tem cor ?
então começo a rememorar outros carnavais

Lembro bem do dia
na praça da república
a cor da farda da polícia

reflito ainda bêbado se; a fome tem cor?
e finalmente - ainda bêbado - compreendo

Cru
simples
e visceral

essa fome é cinza

da cor da pele daquela menina
da cor da pele de um tubarão
da cor da miséria em questão
uma cor, de hipocrisia cristã

E quem se atreve a classificar os normativos?
sinta o privilégio, é quarta-feira de cinzas
amanhã alguém vem entregar a ração na porta

Francisco de Assis

20 fevereiro, 2012

Dilúvio

As palavras de Mr. Orwell tem ganhado forma a cada dia
seres avarentos congratulando e nomeando um novo herói
banalidade amordaçada já faz parte da sua cesta básica

Para onde vão os sonhos? Aonde se escondem as crianças?

Seu juramento de nada me serve, bastaria um sim ou não
levaria consigo essa marca da mentira? da desconfiança?
ao invés disso, responde aquilo que vem do seu coração

Os meus, os teus, onde estarão agora? Tu ainda respira?

Noutras preces eu vi o tempo rompendo a terra em ciclos
Água inundando o sertão, rochas pairando sobre a cidade
Um pássaro-corneta anunciando o que vinha pela frente..

partícula;
gotícula;

mãos em concha esperando o que beber cair do próprio sol
e o primeiro mercenário vendendo pódio em troca de carne
suor em troca de sangue, sangue as custas do pão e circo

Água, bastante água, uma enorme tempestade cair do céu
para lavar os teus olhos e, afogar o circo de horrores

voltar a terra traz beleza e esperança
amizade me faz sorrir e me leva a crer

Não se engane pois sou otimista peço água
todos os dias em minhas preces, peço água.

Francisco de Assis

14 fevereiro, 2012

Castelos de Nagô

O olhos transbordam de alegria ao ver correr a pequena cria
a paisagem acolhe o pequeno rebento, é Nagô, é Nagô, é Nagô
castelo d'areia, baldinho cheio d'água;
" - quanta tatuíra odé!"

os pés deixam o rastro entre o percalço da caminhada no axé

É vida é som, mar e sol, papai, mamãe, amigos, dia perfeito
deixa estar o tempo sem direção que o vento traz um sossêgo

Take it easy my brother Charles
Take it easy meu irmão de cor
Take it easy my sister Xanda
Take it easy minha irmã de cor

Momento atemporal. Apenas um, nada mais!
Sem retrato nem marca, apenas lembrança.

Nagô menino de praia e seu boné virado pra trás
Sorriso doce e olhar atento, a paisagem é dele;
do pequeno-grande rebento.

Assis Monteiro

09 fevereiro, 2012

Entre meios

Olhares atentos ao que nos resta de dignidade
passo torto, apressado, encontrando um começo
prefiro de ontem os canteiros que o entremeio
nas calçadas há poeira cobrindo desonestidade

Quem se atreve a apontar? É o mesmo currículo
Dá pra acreditar em quem? É o mesmo discípulo

Conversa "fiada" (um dia ele paga o que deve)
Evolução espiral de alma ou devir consolação?
Ainda assim prefiro canteiros que entre meios.


Francisco de Assis